Recentemente a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça ao julgar o REsp 1981646 entendeu que a transferência de imóvel pelo devedor à filha menor de idade, tornando-se insolvente, por si só caracterizaria fraude à execução, independentemente de haver execução pendente ou penhora averbada na matrícula imobiliária, ou mesmo prova de má-fé.

A controvérsia analisada pelo colegiado teve origem em ação ajuizada pela empresa para cobrar por serviços prestados. A fim de garantir a execução, o juízo determinou a penhora de um imóvel registrado no nome do devedor.

Contra essa decisão, a filha menor do executado opôs embargos de terceiro, sob a alegação de que ela recebeu o imóvel como pagamento de pensão alimentícia, a partir de um acordo entre sua mãe e o devedor, homologado judicialmente.

Em primeiro grau, os embargos foram rejeitados, sob o entendimento de que a transferência do imóvel pelo devedor à filha caracterizou fraude à execução. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) reformou a sentença por considerar que não teria havido fraude nem má-fé da embargante, tendo em vista a ausência de averbação da penhora ou da execução na matrícula do imóvel.

Entretanto o Superior Tribunal de Justiça reformou a decisão, tendo a relatora do recurso no STJ, ministra Nancy Andrighi, consignando que, para a jurisprudência, a inscrição da penhora no registro do bem não constitui
elemento integrativo do ato, mas requisito de eficácia perante terceiros. Por
essa razão, o prévio registro da penhora gera presunção absoluta (juris et de jure) de conhecimento para terceiros e, portanto, de fraude à execução caso o bem seja alienado ou onerado após a averbação.

A magistrada também apontou que, por outro lado, de acordo com a
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, se o bem se sujeitar a registro, e a penhora ou a execução não tiver sido averbada, tal circunstância não impedirá o reconhecimento da fraude à execução, cabendo ao credor comprovar que o terceiro adquirente tinha conhecimento de demanda capaz de levar o alienante à insolvência.

Apesar disso, a relatora destacou que, no caso dos autos, não caberia à empresa comprovar a má-fé da embargante, pois o devedor transferiu seu patrimônio em favor de descendente menor, como maneira de fugir de sua
responsabilidade perante os credores.

De acordo com a ministra “não há importância em indagar se o descendente conhecia ou não a penhora sobre o imóvel ou se estava ou não de má-fé. Isso porque o destaque é a má-fé do devedor que procura blindar seu patrimônio dentro da própria família mediante a transferência de seus bens para seu descendente, com objetivo de fraudar a execução”.

Segundo a ministra, não reconhecer que a execução foi fraudada porque não houve registro de penhora ou da pendência de ação de execução, já que não se cogitou de má-fé da filha, “oportunizaria transferências a filhos menores, reduzindo o devedor à insolvência e impossibilitando a satisfação do crédito do exequente, que também age de boa-fé”.

Neste caso específico entendo ser acertada a decisão do Superior Tribunal de Justiça, tendo em vista que não se justifica quando o devedor, em estado de insolvência, transfere seu patrimônio em favor de descendente, sobretudo menor, como maneira de fugir de sua responsabilidade perante credores.


Entretanto cabe destacar que há casos em que a doação de imóvel para
descendente não caracteriza fraude contra credores, conforme precedente da própria 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que ao julgar o REsp
1.926.646 consignou que nos casos em que “a doação do imóvel em que reside, pais e filhos, não caracteriza fraude contra o credor”, pois a propriedade – considerada bem de família – seria impenhorável, e que doação neste caso não configura fraude, uma vez que o prejuízo ao credor seria causado pela alteração da finalidade de uso do bem ou pelo desvio de eventual proveito econômico obtido com a transferência de propriedade.

José Wellington Omena Ferreira – OAB/DF nº 28.613 – Nascido em Brasília/DF, formado em Direito pelo Centro Universitário de Brasília – UNICEUB, Pós-graduando em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET, membro da Comissão de Assuntos Tributários da OAB/DF, triênio 2013/2015 e 2015/2018, Cursando LLM em Direito Empresarial no Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais – IBMEC.