A regra processual da execução fiscal prevê a possibilidade de o contribuinte devedor apresentar como meio de defesa os embargos à execução fiscal. Ocorre que a Lei de Execuções fiscais, a chamada “LEF”, prevê que os embargos à execução fiscal só serão admitidos se a execução fiscal estiver garantida, vejamos:

“Art. 16 – O executado oferecerá embargos, no prazo de 30 (trinta) dias, contados:

I – do depósito;

II – da juntada da prova da fiança bancária ou do seguro garantia; (Redação dada pela Lei nº 13.043, de 2014)

III – da intimação da penhora.

§ 1º – Não são admissíveis embargos do executado antes de garantida a execução.”

Isso significa dizer que o prazo para apresentar os embargos à execução fiscal só começa a correr após a efetiva garantia da dívida que está sendo executada.

Pois bem, em que pese o dispositivo legal prever tal exigência, o Superior Tribunal de Justiça vem relativizando tal entendimento e já reconheceu em alguns julgados a possibilidade de oposição dos embargos à execução fiscal mediante garantia parcial da dívida executada, inclusive em sede de recursos repetitivos (Tema 260), como é o caso do RESP nº 1.127.815/SP da Relatoria do Ministro Luiz Fux.

O recurso afetado pela regra dos repetitivos considerou que a insuficiência de penhora não é causa bastante para determinar a extinção dos embargos do devedor, cumprindo ao magistrado, antes da decisão terminativa, conceder ao executado prazo para proceder ao reforço, à luz da sua capacidade econômica e da garantia pétrea do acesso à justiça.

Dessa forma, após o julgamento do Recurso Repetitivo pelo STJ, passou-se a admitir a oposição dos embargos à execução fiscal, quando o juízo não está totalmente garantido, ou seja, quando houver garantia parcial do juízo.

Os argumentos da tese formulada levaram em consideração a alteração trazida pela Lei nº 11.382, de 6/12/2006, que alterou a redação do artigo 736 do Código de Processo Civil de 1973 para determinar que “o executado, independentemente de penhora, depósito ou caução, poderá opor-se à execução por meio de embargos”, vejamos trecho do julgado:

“(…) Em atenção ao princípio da especialidade da LEF, mantido com a reforma do CPC/73, a nova redação do art. 736, do CPC dada pela Lei nº 11.382/2006 – artigo que dispensa a garantia como condicionante dos embargos – não se aplica às execuções fiscais diante da presença de dispositivo específico, qual seja o art. 16, §1º da Lei nº 6.830/80, que exige expressamente a garantia para a apresentação dos embargos à execução fiscal (…).”

Tal entendimento foi proferido antes do Novo CPC, mas já adequou o entendimento ao novo dispositivo do CPC alterado na época.

Tal situação não é diferente nos dias atuais, pois, em 2019, ou seja, após o Novo CPC, a 1ª Turma do STJ, ao julgar o Recurso Especial 1.487.772/SE, decidiu que “deve ser afastada a exigência da garantia do juízo para a oposição de embargos à execução fiscal, caso comprovado, inequivocamente, que o devedor não possui patrimônio para garantia do crédito exequendo.”

¹ (REsp 1127815/SP, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/11/2010, DJe 14/12/2010)
²  Idem
³ (REsp 1487772/SE, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 28/5/2019, DJe 12/6/2019)

Importante esclarecer que a 1ª Turma do STJ considerou o critério da especialidade das leis, de forma a entender ser cabível a exigência da garantia para oposição dos embargos à execução, conforme prevê o artigo 16, §1º, da LEF, porém, nos casos em que for comprovado que o devedor não possui patrimônio, é possível relativizar a aplicação deste dispositivo e aceitar a garantia parcial, para não ferir o princípio do acesso a justiça, do contraditório e ampla defesa, conforme registrado no voto do Relator:

“Portanto, é indene de dúvidas que está em pleno vigor o dispositivo legal da LEF que exige a garantia do juízo para a admissão dos embargos do devedor opostos pelo executado.

Não obstante esse entendimento, vendo a questão jurídica sob outro ângulo, verifica-se que a Constituição Federal de 1988 resguarda a todos os cidadãos o direito de acesso ao Poder Judiciário, ao contraditório e à ampla defesa (art. 5º, CF/88), tendo esta Corte Superior, com base em tais princípios constitucionais, mitigado a obrigatoriedade de garantia integral do crédito executado para o recebimento dos embargos à execução fiscal. E esse tema, mutatis mutandis, também foi definido na Primeira Seção, no julgamento do REsp 1.127.815/SP, na sistemática dos recursos repetitivos.”

Como bem colocado pelo ministro relator do caso, Ministro Gurgel de Faria, a questão deve ser analisada sob o prisma da hipossuficiência do executado, e não com base no critério da obtenção (ou não) do benefício da justiça gratuita, conforme verifica-se de parte de seu voto, vejamos:

“Não obstante essa conclusão, entendo que a controvérsia deve ser resolvida não sob esse ângulo (do executado ser beneficiário, ou não, da justiça gratuita), mas, sim, pelo lado da sua hipossuficiência, pois, se adotarmos tese contrária, chegaremos à hipótese, como bem delineado no repetitivo citado

⁴ Idem

anteriormente, “que tal implicaria garantir o direito de defesa ao ‘rico’, que dispõe de patrimônio suficiente para segurar o Juízo, e negar o direito de defesa ao ‘pobre'”.”

Dessa forma, verifica-se que os embargos à execução fiscal podem ser admitidos sem a garantia total da execução fiscal desde que o devedor comprove que não há patrimônio suficiente para garantir a execução fiscal.

⁵ Idem