Recentemente, a 7ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região negou provimento à apelação da União Federal que concedeu parcialmente a segurança em ação que objetivava a exclusão das gorjetas da base de cálculo do Simples Nacional, proposta por uma empresa de comércio de bebidas e alimentos.

Tratou-se de Mandado de Segurança em face de ato praticado pelo Delegado da Secretaria da Receita Federal do Brasil em Teresina, visando, em síntese, o sobrestamento da cobrança do Simples Nacional sobre as taxas destinadas à remuneração dos empregados gorjetas e artistas (“couvert artístico”), requerendo ainda a exclusão das citadas rubricas do limite da receita bruta prevista no art. 3º, §9º, da LC 123/2006. 

De acordo com o contribuinte, ao exercer a exploração do serviço de bares e restaurante, está sendo obrigado a incluir na base de cálculo do Simples Nacional os valores que arrecada a título de gorjeta e couvert artístico pagos pelos clientes aos funcionários e artistas que se apresentam no estabelecimento.

Sustenta que os referidos valores não integram sua receita bruta e, portanto, sobre eles não podem incidir os tributos sobre a receita, faturamento ou lucro, reputando, assim, ilegal a exigência do Fisco.

Entendo que o aludido traduz a melhor intelecção sobre a matéria, não havendo razoabilidade na pretensão de se tributar a pessoa jurídica, com base em valores de natureza salarial, incorporados à remuneração de seus empregados. 

Nessa mesma linha, o Superior Tribunal de Justiça já consignou que a gorjeta, compulsória ou inserida na nota de serviço, tem natureza salarial e, em consequência, há de ser incluída no cálculo de vantagens trabalhistas e deve sofrer a incidência de apenas tributos e contribuições que incidem sobre o salário. 

A exemplo do entendimento de ser ilegal a cobrança do ISS sobre os valores recebidos a título de gorjeta, é também ilegítima a exigência do recolhimento do PIS, IRPJ, CSLL e Cofins sobre o valor cobrado como taxa de serviço, desde que repassado integralmente aos empregados. 

Ademais, consoante o art. 457, da CLT, caput, “compreendem-se na remuneração do empregado, para todos os efeitos legais, além do salário devido e pago diretamente pelo empregador, como contraprestação do serviço, as gorjetas que receber”. 

O parágrafo terceiro, do mesmo art. 457, da CLT, explicita o que se entende por gorjeta: “Considera-se gorjeta não só a importância espontaneamente dada pelo cliente ao empregado, como também aquela que for cobrada pela empresa ao cliente, como adicional nas contas, a qualquer título, e destinada à distribuição dos empregados.

Assim, a gorjeta é, pois, receita de terceiro, que, apesar de circular no caixa da empresa, deve ser transferida irremediavelmente ao funcionário a título de complemento da remuneração do serviço prestado por ele. Não se pode, então, no presente caso, presumir que a empresa impetrante esteja descumprindo a lei e permanecendo com as gorjetas como receita própria.

Neste sentido, ao analisar o caso, o TRF 1ª Região destacou que o art. 3º, § 1º, da Lei Complementar nº 123/2006, que instituiu o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte, estabeleceu o que é considerada receita bruta (produto da venda de bens e serviços) e que os valores decorrentes da arrecadação de gorjeta não constituem renda, faturamento ou lucro para o estabelecimento.

Ressaltou-se ainda que os valores decorrentes da arrecadação de gorjeta não devem ser incluídos na cobrança do Simples Nacional e nem no limite da receita bruta, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Sendo importante também consignar que, por decisão da Comissão Técnica Permanente do ICMS, a gorjeta deixou de ser receita própria dos estabelecimentos (Lei nº 13.419/2017). Assim, não estará mais sujeita à tributação do imposto. A deliberação ocorreu no Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) do Ministério da Fazenda. O Confaz comunicou a decisão à Federação Nacional de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares (FNHRBS).

Com a mudança, agora o registro da gorjeta na nota fiscal de consumo é obrigatório. O Confaz considera que a medida mais coerente e segura é manter o tratamento semelhante ao do Convênio ICMS 125/2011, registrando a gorjeta como item de cupom fiscal, mas agora inserindo seu valor no totalizador NÃO INCIDÊNCIA (N) do ECF. Esse tratamento passa a valer aos contribuintes do regime normal de apuração do ICMS e aos enquadrados no Simples Nacional.

Já em relação ao couvert artístico, não há previsão legal, nem jurisprudência consolidada sobre a não incidência do imposto. Sendo importante destacar que o TRF 1ª Região julgou extinta tal discussão sem resolução de mérito, por entender que o Mandado de Segurança não seria adequado, pois, diferentemente da gorjeta, não há regime legal que o especifique. 

Entretanto consignou que, pelo fato de seu pagamento ser fruto de contratos realizados entre as empresas e os artistas, não há, portanto, como caracterizá-lo como compondo ou não a receita bruta de um estabelecimento comercial. Tal conclusão variará conforme o caso, se os contratos realizados pelo estabelecimento preveem o repasse de todo o valor arrecadado a título de couvert ou se o pagamento deve ser feito por valor fixo, sendo necessário comprovar que, no caso concreto, houve o efetivo repasse dos valores aos músicos – prova esta que não poderia ser produzida mediante mandado de segurança, até porque incabível nos estreitos limites de um mandado de segurança.

Desta forma, no caso de efetiva comprovação de que o couvert artístico não comporta em receita do bar/restaurante, mas sim do artista, entendo que não constitui renda do estabelecimento comercial, não devendo ser recolhido do imposto pelo contratante, para tanto se faz necessário o reconhecimento do judiciário, a fim de evitar qualquer autuação fiscal.